Amostras de feijão brasileiro chegam ao banco do fim do mundo
SEMENTES SALVAS DE CATÁSTROFE GLOBAL
Imagine uma gigantesca tragédia natural em nível planetário, com vulcões em erupção, terremotos, maremotos – mas uma hecatombe feia mesmo, digna do pior filme-catástrofe como nunca realizado.
Extinção em massa, os poucos sobreviventes tentam reestabelecer a vida no planeta. Nesse caso, o filme não acaba quando o sol aparece, as águas retrocedem ou as bolas de fogo param de cair do céu.
O final feliz ocorre quando uma expedição dos que resistiram à destruição alcança o Banco Global de Sementes de Svalbard, na Noruega, que agora também será abastecido com o feijão brasileiro.
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) fez a seleção – chamada coleção nuclear – das amostras de diversas variedades de feijão que acaba de chegar a Oslo, capital da Noruega.
A amostra segue, então, para o pequeno arquipélago de Svalbard, uma região remota próxima ao Polo Norte. Lá, ficará acondicionada no fundo de um túnel de 125 metros, dentro de uma montanha.
Em três câmaras de segurança máxima, abertas apenas quatro vezes ao ano, ficam armazenadas, a -20 graus Celsius, junto com amostras de sementes de alimentos enviadas de todas as partes do mundo.
Em caso de uma hipotética catástrofe, é de lá que vai sair o recomeço da agricultura mundial.
O termo coleção nuclear é utilizado para definir um grupo limitado de amostras que representam grande parte da variáveis genéticas das espécies vegetais.
Como se trata de uma coleção nuclear com diversidade bem grande, vai ter feijão-preto, carioquinha, feijão-vermelho, com manchinhas, feijão do tipo trepador, do tipo que vira uma pequena árvore, aquele mais adaptado à colheita comercial.
“A ideia é ser o mais variado possível”, explica a pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, Marília Burle.
A coleção brasileira de feijão, com 514 amostras, é a segunda remessa enviada a Svalbard. Em 2012, a Embrapa já havia mandado ao banco nórdico 264 amostras de milho e 541 de arroz.
Outras espécies devem ser depositadas no banco, mas ainda não há previsão para que isso ocorra já que nem todos os bancos de germoplasma (unidades de conservação de material genético das plantas) têm uma coleção nuclear pronta.
De qualquer forma, para esses três produtos importantes na agricultura brasileira, a coleção estabelecida é reconhecida como o filé mignon de uma coleção, pois representa ao máximo a diversidade genética da coleção maior.
O governo norueguês financia o banco de Svalbard e também faz um grande esforço para manter a cidade com moradores o ano todo – um lugar muito frio que passa três meses totalmente no escuro.
Além do próprio governo, o outro financiador é o Global Crop Diversity Trust, uma ONG internacional que vem bancando muitas ações de recursos genéticos no Brasil.
O banco internacional tem capacidade para armazenar 4,5 milhões de amostras de sementes e sua localização também leva em conta a hipótese de uma catástrofe mundial de proporções apocalípticas.
Este, entretanto, não é o único. Há outros bancos genéticos espalhados pelo mundo, mas dependentes de energia elétrica e passíveis de acidentes.
A ideia de Svalbard é prever o risco de um apagão global, uma coisa mais fora do controle ou até mesmo guerras. Por isso ele foi construído no local mais próximo possível do Polo Norte, por ser refrigerado naturalmente.
Marília conta que o banco também foi construído de forma a resistir a impactos vindos do céu e explosões nucleares. “O material lá duraria mais do que aqui, com um verão quente. A ideia é de um backup mesmo, pensando em uma catástrofe em nível mundial”.