Banco HSBC – Hong Kong & Shanghai Banking Corporation
COMO TUDO COMEÇOU
Quando você for à sua agência bancária para conversar com o gerente, nunca se esqueça que aquele sujeito engravatado, botando banca do outro lado do balcão ou da mesa, não passa de pau-mandado de um agiota que muito provavelmente descende do tipo de gente que iniciou as suas atividades financeiras como no impressionante relato a seguir. É de embrulhar até os mais insensíveis estômagos.
HSBC, ORIGEM DO ÓPIO
De Londres a Hong Kong, as belas fachadas dos grandes centros de negócios com frequência escondem a violência de suas origens. Esse é o caso do banco HSBC, cujas raízes mergulham em guerras coloniais e comerciais conduzidas pelo Império Britânico na Ásia.
por Jean-Louis Conne *
No outono europeu de 2009, quatro letras − H, S, B e C − lideravam as principais manchetes dos jornais quando um antigo funcionário desse célebre banco enviou ao fisco francês uma lista de clientes suspeitos de fraude. A mesma sigla aparece de novo em 2011, dessa vez no contexto da demissão anunciada de cerca de 30 mil pessoas.
Mas o que está por trás dessas letras? Geralmente, elas são precedidas da expressão “banco britânico”, mas, na verdade, trata-se da abreviação de Hong Kong & Shanghai Banking Corporation. A trajetória dessa empresa de comerciantes na China, com sede londrina e vista para o Rio Tâmisa, começa com uma história de ópio.
TRAFICANTES
No início do século XIX, nasceu em Londres, capital do Império Colonial Britânico, a Companhia Peninsular e Oriental de Navegação a Vapor — P&O, Peninsular and Oriental Steam Navigation Company. [A empresa seria revendida em 2006 por 3,9 bilhões de libras esterlinas para a Dubai Ports World, o terceiro operador portuário mundial, filial da Dubai World, holding pertencente ao governo de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos]
Seu primeiro navio de carga a vela e a vapor, o San Juan, saiu das docas de Londres em 1° de setembro de 1837 para encalhar em águas rasas.
Outros navios da companhia afundaram, entre os quais o Carnatic, cujos destroços foram encontrados nos recifes de Abou Nawas, no Mar Vermelho.
Mas a companhia sobreviveria à má sorte.
Em 1839, a P&O assinou os contratos para o transporte do correio para Alexandria, no Egito, via Gibraltar e Malta.
Depois de se fundir com a Companhia Transatlântica de Navios a Vapor (Transatlantic Steamship Company), ela criou, em 1844, aquilo que se pode chamar de os primeiros cruzeiros de luxo no Mediterrâneo.
Dez anos mais tarde, a P&O ligaria seu destino ao da Companhia de Navegação a Vapor das Índias Britânicas (BI − British India Steam Navigation Company), cujos navios transportavam o correio entre Calcutá, na Índia, e Rangun, na Birmânia. Seu proprietário, James Mackay, um administrador colonial escocês, iria se tornar presidente da P&O, a qual, por fim, absorveria a BI.
O próprio Mackay mantinha relações estreitas com Sheng Xuanhai, ministro dos Transportes da China na dinastia Qing (Manchu), a última a reinar, até a abolição do governo imperial em janeiro de 1912.
VÍCIO SE ESPALHA
Favorável à introdução da tecnologia ocidental apesar das tensões político-militares, Sheng se tornou defensor dessa causa especialmente em Xangai – onde fundou a Universidade Jiao Tong, orientada para a mecânica, engenharia e equipamentos militares –, depois em Hong Kong.
Desempenhando um papel importante, ele promoveu a cidade como a mais tecnológica da China. Em 1902, Sheng e Mackay fecharam, em nome da China e do Reino Unido, um acordo conhecido como Tratado Mackay, que versava sobre a proteção de marcas e patentes.
Foi nesse contexto que outro escocês, Thomas Sutherland, entrou para a P&O. Ele fez carreira na empresa, colaborou para a construção das docas em Hong Kong e se tornou o superintendente da P&O, mas também o primeiro presidente da Hong Kong e Whampoa Dock, em 1863.
Nessa época, 70% do frete marítimo estava relacionado com o ópio vindo das Índias, vendido aos chineses por negociantes britânicos e outros, para desespero das autoridades chinesas, que tentavam, em vão, fazer oposição a esse comércio, que devastava com o vício a população local.
GUERRA E COLHEITA
Sutherland entendeu a mensagem: a configuração era ideal para o desenvolvimento de um banco comercial. Com outros, ele fundou em 1865 o Hong Kong & Shanghai Banking Corporation, o famoso HSBC. No conselho de administração, presidido por Francis Chomley, estava igualmente a sociedade comercial Dent & Co., cujo nome vem de seu criador, Thomas Dent.
Em 1839, o alto funcionário chinês Lin Zexu, reconhecido por sua competência e rigidez moral, havia lançado contra ele um mandato de prisão com o objetivo de forçá-lo a abandonar seus armazéns de ópio, que violavam a proibição decretada pelas autoridades chinesas.
Esse foi um dos elementos que provocaram a Primeira Guerra do Ópio, encerrada em agosto de 1842 pelo primeiro “tratado desigual”, o de Nanquim.
No fim da Segunda Guerra do Ópio (1856-1860), as potências britânica e francesa imporiam a criação de concessões territoriais sob administração estrangeira, a abertura de vários portos chineses ao comércio estrangeiro e a legalização do comércio de ópio. O conflito terminaria cinco anos antes de Sutherland criar o HSBC.
O banco escolheu bem o nome: alguns desses caracteres significam, em chinês, “reunir”, “colheita” e “riqueza”.
De fato, o HSBC reuniu suas primeiras riquezas graças à colheita do ópio das Índias, depois do Yunnan, província do Sudoeste da China. Desde 1920, filiais se instalaram em Bangcoc e Manila.
Depois de 1949, o banco concentrou suas atividades em Hong Kong e, entre 1980 e 1997, instalou-se nos Estados Unidos e na Europa.
Só mudou sua sede social de Hong Kong para Londres em 1993, antes da devolução do território à República Popular da China, anunciada em 1997.
Em 1999, as ações do HSBC Holdings foram cotadas em terceiro lugar na Bolsa de Nova York.
O grupo adquiriu a Republic New York Corporation (atualmente integrada à HSBC USA Inc.), assim como a empresa irmã Safra Republic Holdings SA (hoje HSBC Republic Holdings SA, em Luxemburgo).
Em 2007, o grupo registrou um resultado recorde, descontado o pagamento de impostos, de US$ 24 bilhões, dos quais 60% vêm de mercados emergentes da Ásia, do Oriente Médio e da América Latina. Pela primeira vez, os lucros acumulados na China atingiram US$ 1 bilhão naquele mesmo ano − tanto quanto na França.
Segundo resultados publicados em 1º de agosto de 2011, os lucros comerciais bancários do HSBC apresentaram um crescimento de 31%, e seu faturamento bruto se elevou a US$ 11,5 bilhões.
Desde o fim de 2010, é o escocês Douglas Flint quem manda nos destinos do HSBC Holdings.
E, desde março de 2011, Laura May Lung Cha é a presidente adjunta, não executiva, do HSBC. Uma ascensão tão notável que a fez delegada de Hong Kong no 11° Congresso da República Popular da China…
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* Jean-Louis Conne, para o Le Monde Diplomatique, é jornalista, ex-redator chefe da revista européia Animan e autor de La Croix tibétane (A Cruz tibetana), Mondialis, Bex (Suíça), 2009