BRICs fortalecem ainda mais os mercados internos para crescer
ANDANDO COM AS PRÓPRIAS PERNAS
Brasil, Rússia, Índia e China não poderão crescer se dependerem de exportações aos mercados da Europa e dos EUA, que ficarão estagnados por longo tempo — de 10 a 20 anos. Eles também serão obrigados a fundamentar o seu crescimento na reorganização e expansão de seus mercados internos.
2013 EM DIANTE, O PERÍODO DA INTROVERSÃO
Por Patricia Marrone *
Após quase duas décadas de globalização, as economias de muitos países serão forçadas a “voltarem-se para dentro de si mesmas”, num longo período de introversão das economias nacionais.
Os americanos terão de lidar com seu abismo fiscal e “arrumar a casa”. Muitos países europeus terão de equacionar suas dívidas internas, buscando, ao mesmo tempo, minimizar o custo social desses ajustes.
Os países árabes deverão consolidar suas democracias, para que, em etapas posteriores, sustentem politicamente seus programas econômicos.
É de consenso que os Brics – Brasil, Rússia, Índia, China – não poderão crescer se dependerem de exportações aos mercados da Europa e dos EUA, que ficarão estagnados por um bom tempo.
Eles também se verão obrigados a fundamentar o seu crescimento na reorganização e expansão de seus mercados internos. E os chineses sabem disso.
Com um gordo saldo de poupança interna acumulada e planejamento centralizado, iniciaram, desde junho de 2011, um profundo movimento de reformas, fundamentado no desenvolvimento das províncias do interior.
Importantes iniciativas têm sido adotadas pela China. Algumas delas, se devidamente adaptadas, fortaleceriam e impulsionariam o crescimento regional também no Brasil.
Aprimoramento do sistema de gestão das províncias: o governo central chinês desenvolveu critérios de competição por comparação entre dirigentes locais, para premiá-los ou puni-los em razão do desempenho relativo no provimento de serviços públicos.
O mecanismo tenta substituir, mesmo que parcialmente, o critério de seleção por avaliação dos eleitores, o que ocorre nos países democráticos.
Nós, brasileiros, podemos selecionar políticos pelo voto, mas o aprimoramento dos critérios adotados para pautar as concessões dos créditos do BNDES a Estados e municípios pela qualidade do gasto seria útil.
Além disso, o sistema de gestão por indicadores adotado no Estado de Pernambuco poderia ser disseminado para outros Estados.
Concentração setorial e espacial da indústria: na China, as regiões estão buscando a especialização crescente e as empresas estão se tornando mais interconectadas – tanto dentro de setores quanto dentro de regiões geográficas definidas.
No Brasil, existem alguns arranjos produtivos locais, porém a guerra fiscal entre os Estados e o processo de desindustrialização vivenciados nos últimos anos desagregaram as empresas e seus fornecedores entre as regiões.
Com isso, a estrutura industrial nacional reduziu a capacidade de integração vertical e a carência de mão de obra qualificada em alguns setores se acentuou.
As soluções para baixar o custo dessa “desconexão” seriam melhorar as infraestruturas de transportes e de educação no entorno dos novos polos industriais e enfrentar a reforma fiscal no âmbito nacional.
Aumento da colaboração entre universidades e empresas: a colaboração universidade-indústria tem sido adotada na China, particularmente na província de Guangdong.
Ela é usada como canal de transferência de conhecimento, inovação e desenvolvimento econômico e tecnológico regionais.
No Brasil, alguma integração desse tipo existe, mas está concentrada em poucas cidades das Regiões Sudeste e Sul.
Ampliação da abrangência do sistema de saúde: a reforma do sistema de saúde na China prevê a instalação de um ou dois hospitais em cada uma das 2.853 províncias até o fim de 2015 e investimentos em toda a cadeia desse sistema.
O objetivo é ampliar o acesso da população aos serviços de saúde. No Brasil, há uma enorme carência de hospitais no interior, principalmente no Norte e no Nordeste do País.
A exemplo da China, há espaço para aprimoramentos em várias áreas no interior do Brasil.
Inúmeras oportunidades surgirão desse processo de introversão, inicialmente nos setores de construção civil, energia, logística, transportes, turismo, educação, cultura e saúde, que seriam estimulados.
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* Patricia Marrone (no Estadão) é economista e sócia da WebSetorial, empresa de consultoria para sindicatos e entidades patronais.