Velha mídia lincha autora do livro didático ‘Por uma Vida Melhor’
NÓS PEGA O PEIXE E ELES FICA COM A CONCORDÂNCIA
O livro “Por uma vida melhor”, da professora Heloísa Ramos — distribuído a 485 mil estudantes jovens e adultos pelo Programa Nacional do Livro Didático, do Ministério da Educação –, defende o uso da linguagem popular, diferente da norma culta, mas não necessariamente errada, no caso da linguagem oral. Só que o jornalismo de esgoto desencadeou uma violenta campanha não só para criminalizar como promover o linchamento público da educadora. A mídia golpista volta a se assanhar.
DISCUSSÃO SOBRE LIVRO DIDÁTICO SÓ REVELA IGNORÂNCIA DA GRANDE IMPRENSA
Por Marcos Bagno *
Para surpresa de ninguém, a coisa se repete. A grande imprensa brasileira mais uma vez exibe sua ampla e larga ignorância a respeito do que se faz hoje no mundo acadêmico e no universo da educação no campo do ensino de língua.
Jornalistas desinformados abrem um livro didático, leem metade de meia página e saem falando coisas que depõem sempre muito mais contra eles mesmos do que eles mesmos pensam (se é que pensam nisso, prepotentemente convencidos que são, quase todos, de que detêm o absoluto poder da informação).
Polêmica? Por que polêmica, meus senhores e minhas senhoras? Já faz mais de quinze anos que os livros didáticos de língua portuguesa disponíveis no mercado e avaliados e aprovados pelo Ministério da Educação abordam o tema da variação linguística e do seu tratamento em sala de aula.
Não é coisa de petista, fiquem tranquilas senhoras comentaristas políticas da televisão brasileira e seus colegas explanadores do óbvio.
Já no governo FHC, sob a gestão do ministro Paulo Renato, os livros didáticos de português avaliados pelo MEC começavam a abordar os fenômenos da variação linguística, o caráter inevitavelmente heterogêneo de qualquer língua viva falada no mundo, a mudança irreprimível que transformou, tem transformado, transforma e transformará qualquer idioma usado por uma comunidade humana.
Somente com uma abordagem assim as alunas e os alunos provenientes das chamadas “classes populares” poderão se reconhecer no material didático e não se sentir alvo de zombaria e preconceito.
E, é claro, com a chegada ao magistério de docentes provenientes cada vez mais dessas mesmas “classes populares”, esses mesmos profissionais entenderão que seu modo de falar, e o de seus aprendizes, não é feio, nem errado, nem tosco, é apenas uma língua DIFERENTE daquela – devidamente fossilizada e conservada em formol – que a tradição normativa tenta preservar a ferro e fogo, principalmente nos últimos tempos, com a chegada aos novos meios de comunicação de pseudoespecialistas que, amparados em tecnologias inovadoras, tentam vender um peixe gramatiqueiro para lá de podre.
Enquanto não se reconhecer a especificidade do português brasileiro dentro do conjunto de línguas derivadas do português quinhentista transplantados para as colônias, enquanto não se reconhecer que o português brasileiro é uma língua em si, com gramática própria, diferente do português europeu, teremos de conviver com essas situações no mínimo patéticas.
A principal característica dos discursos marcadamente ideologizados (sejam eles da direita ou da esquerda) é a impossibilidade de ver as coisas em perspectiva contínua, em redes complexas de elementos que se cruzam e entrecruzam, em ciclos constantes. Nesses discursos só existe o preto e o branco, o masculino e o feminino, o mocinho e o bandido, o certo e o errado e por aí vai.
Darwin nunca disse em nenhum lugar de seus escritos que “o homem vem do macaco”. Ele disse, sim, que humanos e demais primatas deviam ter se originado de um ancestral comum. Mas essa visão mais sofisticada não interessava ao fundamentalismo religioso que precisava de um lema distorcido como “o homem vem do macaco” para empreender sua campanha obscurantista, que permanece em voga até hoje (inclusive no discurso da candidata azul disfarçada de verde à presidência da República no ano passado).
Da mesma forma, nenhum linguista sério, brasileiro ou estrangeiro, jamais disse ou escreveu que os estudantes usuários de variedades linguísticas mais distantes das normas urbanas de prestígio deveriam permanecer ali, fechados em sua comunidade, em sua cultura e em sua língua.
O que esses profissionais vêm tentando fazer as pessoas entenderem é que defender uma coisa não significa automaticamente combater a outra. Defender o respeito à variedade linguística dos estudantes não significa que não cabe à escola introduzi-los ao mundo da cultura letrada e aos discursos que ela aciona.
Cabe à escola ensinar aos alunos o que eles não sabem! Parece óbvio, mas é preciso repetir isso a todo momento.
Não é preciso ensinar nenhum brasileiro a dizer “isso é para mim tomar?”, porque essa regra gramatical (sim, caros leigos, é uma regra gramatical) já faz parte da língua materna de 99% dos nossos compatriotas.
O que é preciso ensinar é a forma “isso é para eu tomar?”, porque ela não faz parte da gramática da maioria dos falantes de português brasileiro, mas por ainda servir de arame farpado entre os que falam “certo” e os que falam “errado”, é dever da escola apresentar essa outra regra aos alunos, de modo que eles – se julgarem pertinente, adequado e necessário – possam vir a usá-la TAMBÉM.
O problema da ideologia purista é esse também. Seus defensores não conseguem admitir que tanto faz dizer assisti o filme quanto assisti ao filme, que a palavra óculos pode ser usada tanto no singular (o óculos, como dizem 101% dos brasileiros) quanto no plural (os óculos, como dizem dois ou três gatos pingados).
O mais divertido (para mim, pelo menos, talvez por um pouco de masoquismo) é ver os mesmos defensores da suposta “língua certa”, no exato momento em que a defendem, empregar regras linguísticas que a tradição normativa que eles acham que defendem rejeitaria imediatamente.
Pois ontem, vendo o Jornal das Dez, da GloboNews, ouvi da boca do sr. Carlos Monforte essa deliciosa pergunta: “Como é que fica então as concordâncias?”. Ora, sr. Monforte, eu lhe devolvo a pergunta: “E as concordâncias, como é que ficam então?
* Marcos Bagno é escritor, tradutor, linguista e professor da UnB — Universidade de Brasília
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Caro redator, você construiu um texto redondo, atraente, dissertativo. Argumentou muito bem, transmite sabedoria, firmeza, conhecimento, e isso estimula o interlocutor a conviver com dignidade. Daniel Bueno
Resposta de Paulo Maurício Machado: Agradeço pelo seu desprendimento e gentileza, prezado, qualidades tão raras neste inóspito ambiente virtual, tantas vezes ocupado por trolls e pessoas com desvios de caráter que mais se preocupam em criticar negativamente do que colaborar com os esforços coletivos. De todas as formas o seu reconhecimento deve ser integralmente creditado ao professor Marcos Bagno, este sim um craque no assunto, respeitado e admirado por todo o nosso mundo acadêmico.
Colegas, saiu um post muito esclarecedor no blog do Luis Nassif, que recomendo apenas para enriquecer e estender a compreensão sobre os interesses em jogo no ataque covarde à professora Heloisa Ramos:
A GUERRA SUJA NO MERCADO DE LIVROS DIDÁTICOS
Em maio de 1933, foram queimadas, pelos nazistas, milhares de obras consideradas impróprias à “verdadeira” cultura alemã. Em maio de 2011, assistimos no Brasil a algo parecido em nome da “verdadeira” Língua Portuguesa.
Se, em maio daqueles anos 30, participaram da queima, estudantes, políticos, autoridades e partidários do Nazismo, muitos sem saber o que estavam defendendo, neste maio de 2011, participam da queima do livro Por Uma Vida Melhor, jornalistas, políticos, membros da Academia Brasileira de Letras e alguns intelectuais oportunistas.
O que estamos vendo hoje não é apenas uma polêmica, que, ademais, poderia ser sadia. O que testemunhamos neste momento é a execração pública de autores que seguiram, estritamente, concepções linguísticas as mais contemporâneas, parâmetros curriculares, frutos de longas discussões e pesquisas sérias, e o bom senso de condenar toda sorte de preconceito de linguagem.
O método [celebrizado por Goebbels] lembra, em muito, aqueles tristes tempos: a mentira vem sendo imposta como verdade por repetição. (…)
Completo: http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-guerra-suja-no-mercado-de-livros-didaticos
Um aluno perguntou ao professor,como se resolvem os erros,ele disse: Os erros não sei te dizer por que são muitos más,posso te passar a forma correta de fazer. CONCLUSÃO PASSE A FORMA CORRETA NA EDUCAÇÃO INICIANDO POR MEIOS CORRETO DAI OS ERROS SERÁ CORRIGIDOS.
Título do livro: POR UMA VIDA MELHOR
Alvo: CRIANÇAS POBRES (a maioria)
Enfim, tá explicada a reação dos porta-vozes do atraso e da intolerância. Simples assim.
Concordo com o Marcos quando diz que é um ataque organizado ou com o suporte do Inst. Millenium. Basta ver como as matérias dos jornais e telejornais são todas concatenadas entre si até nas manchetes e chamadas. É pau puro o tempo todo não havendo espaço para o contraditório. Parece que os textos saem todos os dias da mesma fôrma, como se fosse uma linha de produção. No caso a mesma fábrica de escandalização do nada que atuou na tentativa de derrubar o governo passado.
O PiG (Partido da Imprensa Golpista) age deliberadamente de má-fé por um motivo muito simples:
Os “macjornalistas” (jornalistas macartistas) sabem muito bem que a educadora e autora do livro adotado pelo MEC tem toda a razão na sua proposta, que mesmo não sendo novidade nos meios acadêmicos, é avançada, inquestionável e já vinha sendo adotada na prática há muito tempo.
Mas aí entra o principal, que é criar um falso escândalo para tentar atingir e queimar junto à opinião pública a imagem do ministro Fernando Haddad, da Educação, hoje um nome fortíssimo para disputar a indicação a fim de concorrer à prefeitura de São Paulo nas próximas eleições municipais.
Nesse ponto reside o desespero da turma do Instituto Millenium, que é a cabeça pensante que dá o tom para a imprensa. É só ouvir, por exemplo, as barbaridades do Carlos Alberto Sardenberg e do Adalberto Piotto na rádio CBN (que tb pertence à Globo). O clima chega a ser de histeria incontrolável. Ando até meio preocupado com a saúde dos caras, parece que vão ter um chilique e “empacotar” ao vivo… o que não seria nada mal. Cá entre nós eles bem que podiam nos prestar este serviço de utilidade pública…
Eles pensa que engana quem, né? rsrsrs
Acredito que se o ensino de língua sempre esteve pautado no ensino da norma culta e o nosso sistema de ensino está falido porque não tentar uma outra alternativa!
Apoiado, Lu.