Avalanche de turistas e lixo põem Monte Everest em risco
MONTANHAS DEPREDADAS PELO TURISMO
Ao retornar de uma excursão para contemplar o Monte Aconcágua, duas turistas europeias recém-chegadas de uma subida ao cume entraram na sede administrativa do Parque Provincial com o insólito pedido de um “certificado”.
No comprovante, deveria constar que elas tinham subido os 6.960 metros da montanha mais alta das Américas, situada nos Andes argentinos.
É difícil imaginar que alguém se entregue a uma experiência tão espiritualmente transformadora e ainda precise comprová-la através de rabiscos de tinta num diploma para pendurar na parede.
E o caminho que tinham trilhado sequer se tratava de uma clássica escalada, mas uma espécie de trilha bastante demarcada.
Além disso, existe uma considerável infraestrutura operada por empresas turísticas especializadas neste tipo de aventura “à la carte” nos vários acampamentos que rodeiam as grandes montanhas da Terra.
No caso das patricinhas, tratava-se sobretudo de um patético banquete para o ego.
Alvo de um boom turístico, o Monte Everest também vem sendo “atacado” por mais de trezentos excursionistas diariamente — fato explicado pelo início do melhor período do ano para realizar a ascensão.
Esses dados vieram à tona quando a comunidade de alpinistas profissionais alertou para o perigo e o impacto ambiental da massificação do turismo na região do Himalaia.
A afluência massiva provoca filas gigantescas que se estendem por suas encostas, colocando a todos em perigo diante de uma maior exposição ao mal agudo de montanha e ao risco de congelamento.
Como não bastasse, uma parte significativa do equipamento é deixada para trás, emporcalhando a região: anualmente, três toneladas de lixo são retiradas da montanha.
Hoje em dia estas regiões já não sofrem o assédio de um turismo de luxo, e sim do frenesi massificado de aventureiros de classe média, que desejam acrescentar mais um pico “inacessível” ao currículo.
De preferência, comprovado com um certificado, para poder esfregar a aventura na cara do vizinho, como já faz com o carro de luxo ou a televisão de 86 polegadas.
E assim o ponto culminante do planeta se vê transformado num produto, subvertendo-se o engrandecimento espiritual no mais abjeto consumismo.
Imagine um alpinista perdido por ali que, quase sem forças, se encha de alegria e encontre fôlego para gritar “Civilização!”, ao encontrar o chiqueiro em que se transformaram algumas das paisagens do outrora inacessível Everest.
Com Hugo Gusmao