Crise econômica e financeira internacional se aprofunda

Espiral da crise internacional

A CRISE GLOBAL NO OLHO DO FURACÃO

O Chefe de Redação

Dizem que o tempo é um invento para evitar que tudo aconteça no mesmo instante. A frase original é do escritor Ray Cummings e aparece no seu romance de ficção científica A Garota do Átomo Dourado (publicado em 1929). Parece assim que hoje o tempo colapsa sobre si próprio e, efetivamente, todas as economias do planeta acusam simultaneamente os sintomas e as feridas da crise.

Isto pode parecer uma opinião demasiado pessimista. Afinal de contas a imprensa especializada em negócios e economia se esforça para nos fazer acreditar que a crise global entrou numa fase de calmaria e até de recuperação.

De repente, a violência da crise na Grécia passou momentaneamente para um segundo plano com a “reestruturação” da sua dívida, há uma semana. O euro parece que melhorou a sua posição e surgem outras “boas notícias”. Nos EUA, pelo terceiro mês consecutivo, anuncia-se que foram gerados empregos e fala-se de uma “tímida recuperação”.

Assim, parece que os ventos do furacão amainaram e que lá longe poderia despontar um raio de sol e o anúncio de melhores tempos. Mas não podemos nos deixar enganar pelos comentaristas e “especialistas” da velha mídia.

Na Grécia, o acordo reduziu em mais de 100 bilhões de euros a dívida com credores privados. Mas isso não é senão uma moratória disfarçada da reestruturação da dívida. A prova é que até uma parte dos temidos seguros de não pagamento foi ativada (o montante apenas ultrapassou os 3 bilhões de dólares, o que pode ser absorvido pelas seguradoras sem grandes problemas).

Todo este acordo foi para ganhar tempo, não para encontrar uma solução real para o problema da economia grega.

Ou seja, no fundo, a Grécia permanece sem capacidade de enfrentar o serviço da sua dívida e as condições de política econômica que lhe foram impostas (em especial pelo programa de arrocho, apelidada de “austeridade”) conduzirão necessária e inevitavelmente ao aprofundamento da catástrofe.

O PIB grego já acusa uma queda de 6% em 2011 e este ano o prognóstico é muito mau. O desemprego ultrapassa 22% e entre jovens chega a 50%. Já há mais de 22 mil pessoas sem teto em Atenas.

Todos os componentes da procura agregada da economia grega estão em queda vertical: o salário mínimo reduziu-se em 22% (e para alguns setores a perda será de 32%). O corte da despesa pública representa outro golpe duro na procura agregada.

É evidente que a meta de reduzir a dívida grega a 160% do PIB em 2020 é irrisória. O país vai arrebentar muito antes.

O ritmo da atividade econômica na Europa continua a diminuir e a região entra numa recessão que pode ser duradoura.

O desemprego na União Europeia já atinge os 10,7% e é o mais alto em 13 anos. O “motores” econômicos também não vão bem: o prognóstico favorável para 2012 é que a Alemanha e França cresçam 1,2 e 1,3%, respectivamente.

A Itália e a Espanha mantêm-se mais ou menos estáveis, se levarmos em conta os “diferenciais” de financiamento da sua dívida soberana, mas essas duas economias estão claramente no umbral da uma forte recessão e isso fará que os mercados financeiros voltem a se “inquietar”. O custo financeiro da sua dívida, portanto, voltará a crescer.

Nos Estados Unidos, as boas notícias sobre o desempenho do mercado de trabalho devem ser manejadas com cautela. Muitos dos empregos gerados continuam a ser de muito má qualidade. É normal, os problemas estruturais da economia estadunidense não foram reparados e a tendência à precarização do trabalho mantém-se.

Por outro lado, todos os componentes da procura agregada estão a se contrair: o consumo, o investimento residencial e não residencial e até as exportações. E tal como na Europa, a austeridade na política fiscal não permite vislumbrar nada de bom.

Na China as coisas tampouco andam bem. A anemia mundial afeta as suas exportações e isso envia uma mensagem clara à hierarquia chinesa no sentido de transformar a economia, abandonando a política de exportações selvagens.

Isso implicaria, então, aumentar o consumo interno, o que requer aumentar o nível dos salários e remunerações. Entretanto, os novos líderes em Pequim não parecem inclinar-se nessa direção e já estão apostando na desvalorização da sua moeda, yuan.

Para fechar com chave de ouro, a retórica de guerra no Médio Oriente faz com que o preço do petróleo se mantenha alto, o wue afetará negativamente a economia mundial.

Israel continua a insistir que não permitirá ao Irã equipar-se com armas nucleares. Isso pode ser parte de uma campanha de distração sobre o problema palestino, mas é algo que incide sobre as expectativas e a evolução do preço internacional do petróleo bruto.

No cronômetro da crise, o tempo se deforma para se reconcentrar num ponto: a crise é um monstro que respira e retoma as suas forças.

As leis de mercado levaram a lógica do capital até os rincões mais afastados do planeta. Para esta longa viagem, na sua bagagem o capital levou também as suas contradições e a propensão à crise. Este é o pulso das economias capitalistas.

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Análise de Alejandro Nadal, economista mexicano, no Resistir

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