Eleição: ascensão social, emergência, egoísmo e… inveja!
Venho observando nos últimos anos uma mudança de comportamento bastante interessante dos chamados emergentes da nova classe média brasileira nos inúmeros lugares por onde passo. Me considero extremamente observadora de hábitos e costumes e fiz esse registro no post Os emergentes beneficiados por Lula que votaram em Marina.
Agora, o blog Óleo do Diabo sai com uma análise na mesma linha de raciocínio. Reproduzo trechos centrais do texto aqui, não porque concorde ou discorde no todo ou em parte. Faço-o pela riqueza da reflexão, como sempre candente e polêmica, como só o Miguel do Rosário é capaz de sustentar.
Aos três temas propostos só acho que faltou um enfoque: a inveja, este sentimento gerado pelo egocentrismo e pela soberba de tantos indivíduos, de desejarem ser maiores, melhores e possuir mais que os outros – que FHC, por exemplo, tão bem encarna.
ASCENSÃO SOCIAL, EGOÍSMO E LIBERDADE
Não é de hoje que a agressividade se tornou uma das características marcantes do serrismo. Na verdade, nem existe serrismo propriamente dito, e sim um antilulismo radicalizado, que conseguiu transferir para Dilma todo seu ódio. Todos nós que atuamos na blogosfera política pertencemos à classe média ou nos relacionamos com ela, e sofremos na pele essa hostilidade quase fanática que toma conta das pessoas identificadas com o antilulismo. (…)
O próprio crescimento econômico e a ascensão social acentuou esse egoísmo, tão natural ao ser humano, que o leva a agarrar-se às suas conquistas com uma espécie de pavor, com medo que o mesmo processo que o levou a ascender socialmente possa beneficiar seus vizinhos. É um sentimento maligno, vil, atrasado, mas perfeitamente humano, e como tal inspirado pelo instinto de sobrevivência. Roma decidiu destruir a bela Cartago apenas pelo medo de que esta ameaçasse sua hegemonia. Os EUA tornaram-se uma grande potência democrática impondo regimes totalitários a seu redor e espalhando miséria. Mesmo as pessoas mais generosas não conseguem resistir a uma pontinha de prazer ao saber do fracasso alheio.
Por isso mesmo, as propagandas do governo sobre as dezenas de milhões de famílias que ascenderam à classe média não comove a maior parte desta mesma classe média. Ela sente, afinal, e com razão, que ascendeu devido a seu próprio esforço e não em virtude das qualidades gerenciais daquela senhora com ar orgulhoso e sobrenome estrangeiro.
E a classe média tradicional propriamente dita não aguenta mais ouvir falar em ascensão social, porque experimenta na pele as consequências danosas desse processo. Até pouco tempo, um filho da classe média conseguia facilmente uma vaga na universidade e depois um cargo nas altas esferas do serviço público. Hoje isso está cada vez mais difícil. Os aeroportos eram vazios e confortáveis. O pobre era invisível, inofensivo, submisso, e agora invade os espaços antes reservados aos do andar de cima. Serviços domésticos custavam uma ninharia, hoje são quase um luxo. (…)
Se o egoísmo é inerente ao ser humano, existe uma razão natural para que ele exista. Ele serve à nossa sobrevivência e nos ajuda a nos consolidarmos como indivíduos perante um coletivo muitas vezes massacrante. É sabido como os egoístas e as pessoas sem escrúpulos tem facilidades para vencer na vida que outros não tem. A própria ambição, uma forma de egoísmo, é venerada e premiada hoje como uma virtude. E de certa forma é uma virtude. Sempre foi. Não adianta nos colocarmos no papel de representantes do bem, porque isso seria falso. O mal que permeia a sociedade também está em nós; não fosse assim, seríamos aberrações. A luta contra o mal não é para extirpá-lo, mas para regulá-lo, ponderá-lo, dominá-lo, usar sua energia selvagem a nosso favor e em favor da sociedade.
Esse foi, portanto, a maior deficiência da campanha de Dilma Rousseff, e que poderá inclusive custar-lhe a vitória. Essa falta de compreensão sobre o caráter egoísta (e humano) desta nova classe média, hoje maioria da população brasileira. Ela é ambiciosa. Não quer saber de eliminar a miséria. Ela quer ficar rica, o que também é uma forma de liberdade, talvez a mais efetiva de todas, e para isso não hesitará em incorporar os valores morais e políticos daqueles no alto da pirâmide. (…)
Um setor crescente da classe média brasileira não quer mais esperança. Não quer mais assistência estatal. Não quer bolsa família. Não se empolga com R$ 600 de salário mínimo, porque não quer ganhar salário mínimo. Quer conforto, viagens ao exterior, carro e segurança financeira. O governo também proporcionou isso. Mas não soube mostrar na campanha. Ainda há tempo.
Texto completo no Óleo do Diabo
Pessoal
Achei este texto muito bom e estou repassando porque acho que ele é importante para uma reflexão mais séria.
Abraços a todos
Anabil Martins Diniz – Bil
MARINA… VOCÊ SE PINTOU?
Maurício Abdalla [1]
“Marina, morena Marina, você se pintou” – diz a canção de Caymmi. Mas é provável, Marina, que pintaram você. Era a candidata ideal: mulher, militante, ecológica e socialmente comprometida com o “grito da Terra e o grito dos pobres”, como diz Leonardo.
Dizem que escolheu o partido errado. Pode ser. Mas, por outro lado, o que é certo neste confuso tempo de partidos gelatinosos, de alianças surreais e de pragmatismo hiperbólico? Quem pode atirar a primeira pedra no que diz respeito a escolhas partidárias?
Mas ainda assim, Marina, sua candidatura estava fadada a não decolar. Não pela causa que defende, não pela grandeza de sua figura. Mas pelo fato de que as verdadeiras causas que afetam a população do Brasil não interessam aos financiadores de campanha, às elites e aos seus meios de comunicação. A batalha não era para ser sua. Era de Dilma contra Serra. Do governo Lula contra o governo do PSDB/DEM. Assim decidiram as “famiglias” que controlam a informação no país. E elas não só decidiram quem iria duelar, mas também quiseram definir o vencedor. O Estadão dixit: Serra deve ser eleito.
Mas a estratégia de reconduzir ao poder a velha aliança PSDB/DEM estava fazendo água. O povo insistia em confirmar não a sua preferência por Dilma, mas seu apreço pelo Lula. O que, é claro, se revertia em intenção de voto em sua candidata. Mas “os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da luz”. Sacaram da manga um ás escondido. Usar a Marina como trampolim para levar o tucano para o segundo turno e ganhar tempo para a guerra suja.
Marina, você, cujo coração é vermelho e verde, foi pintada de azul. “Azul tucano”. Deram-lhe o espaço que sua causa nunca teve, que sua luta junto aos seringueiros e contra as elites rurais jamais alcançaria nos grandes meios de comunicação. A Globo nunca esteve ao seu lado. A Veja, a FSP, o Estadão jamais se preocuparam com a ecologia profunda. Eles sempre foram, e ainda são, seus e nossos inimigos viscerais.
Mas a estratégia deu certo. Serra foi para o segundo turno, e a mídia não cansa de propagar a “vitória da Marina”. Não aceite esse presente de grego. Hão de descartá-la assim que você falar qual é exatamente a sua luta e contra quem ela se dirige.
“Marina, você faça tudo, mas faça o favor”: não deixe que a pintem de azul tucano. Sua história não permite isso. E não deixe que seus eleitores se iludam acreditando que você está mais perto de Serra do que de Dilma. Que não pensem que sua luta pode torná-la neutra ou que pensem que para você “tanto faz”. Que os percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula não a façam esquecer os 8 anos de FHC e os 500 anos de domínio absoluto da Casagrande no país cuja maioria vive na senzala. Não deixe que pintem “esse rosto que o povo gosta, que gosta e é só dele”.
Dilma, admitamos, não é a candidata de nossos sonhos. Mas Serra o é de nossos mais terríveis pesadelos. Ajude-nos a enfrentá-lo. Você não precisa dos paparicos da elite brasileira e de seus meios de comunicação. “Marina, você já é bonita com o que Deus lhe deu”.
[1] Professor de filosofia da UFES, autor de Iara e a Arca da Filosofia (Mercuryo Jovem), dentre outros.