Quando o rock envelhece, fica senil e politicamente esclerosado

DECADÊNCIA SEM DECÊNCIA OU ELEGÂNCIA

Esquadrilha da fumaça

A guinada à direita de Lobão, Roger do Ultraje e mais alguns de seus colegas de geração pode ter deixado muita gente decepcionada — pelo menos para aqueles que esperavam alguma coisa deles.

Como podem roqueiros, com seu estilo de vida, vamos dizer, libertário, virarem direitosos?

Como esses caras que mergulharam em sexo, drogas e roquenrol e brigaram com o — vamolá — “sistema” puderam se tornar reacionários depois dos 50?

Eu não tenho certeza da motivação deles (no caso de Lobão, é uma mistura de oportunismo e fanfarronice). Mas é ingenuidade pensar que rockers são automaticamente de esquerda, antiestablishment, revolucionários ou coisa do gênero.

Lobão, Roger e – lembrei de mais um – Leo Jaime não estão sozinhos no mundo em sua paranoia antiesquerdista. Eles fazem parte de uma longa tradição.

Mo Tucker, a veterana baterista do Velvet Underground, a banda mais subversiva de todos os tempos, por exemplo, anunciou há poucos anos sua filiação ao ultradireitista Tea Party.

“Estou furiosa com a maneira como estamos rumando em direção ao socialismo”, disse. “Eu acho que o plano de Obama é destruir a América por dentro”.

Alice Cooper, um dos pioneiros da união entre rock, teatro e filmes de terror nos anos 70, com sua sexualidade ambígua e suas letras depravadas – virou um evangélico fanático e antiobamista de coração.

Joe Perry, guitarrista do Aerosmith, que fazia com o vocalista Steven Tyler uma dupla apelidada toxic twins (dado o grau de ingestão de cocaína), apoiou o republicano John McCain nas eleições de 2008. “Sou republicano desde criança”, afirmou.

Kid Rock é um apoiador da política externa dos EUA no Iraque, fazendo turnês para levantar o ânimo da tropa.

Dave Mustaine, vocalista da banda de metal Megadeth, se juntou recentemente ao rei da teoria da conspiração, Alex Jones, para detalhar sua visão sobre o que eles definem Nova Ordem Mundial (o grupo de judeus, negros, terroristas e o diabo que está dominando o planeta).

Conservadorismo no rock

Ted Nugent, guitarrista e cantor, vive pedindo a pena de morte para ladrões e estupradores. Já falou que o erro dos EUA no Iraque foi não terem feito “o mesmo que em Nagasaki”. É membro fanático da famigerada NRA, o lobby pró-armas dos Estados Unidos.

“Haverá um tempo que os donos de armas serão como Rosa Parks e nos sentaremos na parte da frente de um ônibus”, declarou em sua confusão mental, referindo-se à ativista negra que mudou a história da luta dos direitos civis nos EUA.

Phil Collins prometeu deixar a Inglaterra se o Partido Trabalhista fosse eleito. “Vou me mudar para a Suiça”, avisou.

Noel Gallagher, ex-Oasis, aproveitou a deixa: “Vote nos trabalhistas. Se os conservadores forem eleitos, Phil está ameaçando voltar”.

Em 76, Eric Clapton, bêbado, fez um discurso num show, apoiando o racista Enoch Powell. “Eu acho que Enoch está certo… Nós devíamos mandar todos eles embora. Joguem os pretos fora! Mantenham a Grã-Bretanha branca!”

Johnny Ramone mandou um “Deus abençoe o presidente Bush” quando sua banda foi incluída no Hall da Fama. “As pessoas são liberais quando jovens, e eu tenho a esperança de que elas mudem quando virem como o mundo é realmente”.

Agora, ninguém bate Elvis Presley. Em novembro de 1970, Elvis entregou uma carta de seis páginas para o então presidente Nixon, em que expressava sua preocupação com o país, sugerindo que ele podia usar sua posição para acabar com a “cultura da droga, os elementos hippies e os Panteras Negras”.

Pediu para ser nomeado agente colaborador do FBI no Departamento de Narcóticos e Drogas Perigosas. “Estive estudando a lavagem cerebral comunista e sei que os Beatles são uma força poderosa contra o espírito americano”, revelou. Presenteou Nixon com um Colt da Segunda Guerra.

A foto (acima) dos dois é o item mais requisitado da Biblioteca Nacional, à frente da Constituição.

Uma possível diferença entre os nossos roqueiros e os do exterior — além da obra, evidentemente — é que, em geral, os de lá viraram conservadores depois de ganhar, e não perder, dinheiro, relevância e influência. Aqui é o contrário.

Kiko Nogueira

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