Guerra à guerra: apelo à paz no conflito entre a Rússia e Ucrânia

Análise da guerra entre Rússia e Ucrânia

A LÚCIDA ANÁLISE DA HISTORIADORA RAQUEL VARELA

Por Raquel Varela *

Hoje perguntei a um grupo de jovens o que fariam se fossem mobilizados para a guerra. A resposta foi “já combinamos todos, quebramos um braço no skate para não ir”.

Nestes dias tenebrosos, para onde os líderes dos impérios nos levam, normalizaram a guerra como um ato viril, de coragem, em que homens fortes combatem e “pobres mulheres e crianças são refugiadas”.

Sempre me impressionou, antes desta guerra, quando se referia que as mulheres eram as principais vítimas porque eram a maioria dos refugiados. Evidentemente, são mulheres porque os homens ficam nas guerras a praticar, assistir e ser alvo das maiores atrocidades!

Eles, os homens, são as principais vítimas da guerra e sempre foram.

Não todos os homens, mas os pobres que vêem no exército profissional a única forma de sobrevivência, mantidos na ignorância de um sistema econômico que usa e abusa da pobreza de espírito.

E também filhos das classes médias e trabalhadoras, porque os filhos dos empresários, generais e grandes acionistas nunca estiveram em risco.

Esta guerra – mesmo contra a mais básica mistificação e propaganda – não é diferente de todas as outras. Vende-se muita coragem, entrevistam voluntários, mas fazem-se decretos para mobilizar os homens à força, com leis de conscrição, que os proíbem de fugir.

E cria-se um ambiente de perseguição aos que não querem ir para a guerra, acusando-os de covardia ou traição à pátria.

Pátria, esta ou qualquer outra, o que deu aos homens que morreram por ela? Com sorte, o nome numa rua, ao lado de uma estátua gigante de um general ou presidente.

Pagos com recursos de saúde e educação, neonazistas vão à Ucrânia para “combater”, com a desculpa do “serviço militar obrigatório”.

São só gritos de guerra, aqui e na Rússia, de quem nunca suja as mãos e mandam os outros lavarem-se em sangue. O cinismo se encarrega de encontrar uma justificativa para o injustificável.

“Guerras são coisas de ricos, não as faremos por vocês”, dizia um cartaz numa manifestação nos EUA.

O meu sincero desejo é que os jovens europeus vão todos andar de skate, e que sobretudo organizem a resistência ao militarismo, e renunciem a ser bucha de canhão na economia de guerra.

Guerras se combatem com resistência política democraticamente organizada contra os reais feitores da guerra. Foram assim as resistências na I e na II Guerra – guerras político-sociais contra guerras econômico-militares.

Guerras não se combatem até ao último homem dos filhos dos outros. Os homens, filhos de quem vive do trabalho, são as principais vítimas da guerra. Esperemos que sejam também, como tantas vezes foram no passado, os que lutarão contra as guerras.

Viril não ir à guerra, é desertar; viril e corajoso é fazer greves que doam a quem faz a guerra. Nobre é, como na II Guerra, parar fábricas e transportes; corajoso é lutar por saúde e educação contra orçamentos militares.

É aí que reside todo o humanismo radical – é na luta contra as guerras, pela humanidade como pátria, entre iguais, que nos tornamos dignos de respeito dos outros.

Trair a humanidade, embarcando no militarismo, aceitando o negócio da destruição, é um ato covarde, de quem não quer enfrentar quem realmente detém o poder.

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* Historiadora portuguesa (texto compartilhado de Estátua de Sal e adaptado para o idioma do Brasil).

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